Playlist CoLABOR - Canções de Trabalho vol. 1

O CoLABOR propõe-se a publicar listas de reprodução sobre trabalho, em diferentes volumes. Estas listas de reprodução consistem em conjuntos de canções/peças musicais elaboradas por membros da Equipa CoLABOR ou convidados/as, com a extensão típica de um LP (aproximadamente 8-15 faixas; 30-45min), e acompanhadas por um pequeno texto. O critério passa apenas por haver uma representação/descrição/impressão acerca do trabalho, nas suas múltiplas vertentes. E claro, o gosto pessoal do(s) autor(es) de cada volume.

Certamente em cada volume haverá omissões imperdoáveis, escolhas abjetas, um infindo rol de malfeitas. Mas haverá também, esperamos, alguns encontros felizes.

 

O volume 1 foi elaborado por João Vasco Lopes, Diretor Executivo do CoLABOR.

 

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A playlist CoLABOR – Canções de Trabalho vol.1 começa com Banana Boat (Day-O), composto por Harry Belafonte. Fundamentalmente, porque foi ao ouvi-la que surgiu a ideia desta iniciativa. Mas também porque esta canção começa com um grito (“Day-O”) e um grito é sempre uma boa forma de começar qualquer coisa. A canção tem como sujeito trabalhadores portuários jamaicanos que carregam bananas em contentores. Fazem-no durante a noite para evitar a agressão solar (“Work all night on a drink of rum/Stack banana ‘til the morning come”) e regressam a casa ao amanhecer (“Daylight come and we want to go home”).

E se uns param de trabalhar quando a manhã chega, outros apenas quando o sol se põe, como é o caso em I Be so Glad When the Sun Goes Down. Esta canção reflete, no seu extremo, a desumanização do trabalho: trata-se de uma canção cantada por escravos nos campos sulistas dos Estados Unidos da América.

Para além de Banana Boat, outras canções desta lista falam-nos de profissões concretas. Em Canoeiro (Pescaria), de Dorival Caymmi, uma aproximação ao conteúdo funcional de um pescador (“Cerca o peixe/Bate o remo/Puxa corda/Colhe a rede/Ô Canoeiro/Puxa a rede do mar”); em Tonada del Cabestrero, de Simon Diaz, um pastor que canta pela madrugada (“El cabrestrero cantando/ Su copla en la madruga”). Outras canções vão em sentido semelhante, como Miner’s Song de Woody Guthrie, Ó pastor que choras, de Lopes-Graça, e Maçadeiras do Linho, interpretada por João Aguardela.

Quem estuda as questões do Trabalho rapidamente se depara com a teoria insider-outsider, originalmente desenvolvida por Assar Lindbeck e Dennis Snower em 1988, na qual os insiders são trabalhadores com vínculos contratuais sem termo, e os outsiders trabalhadores desempregados ou com vínculos contratuais não-permanentes. Estes autores pretendiam compreender a razão pela qual os níveis de desemprego eram mais elevados na Europa do que os EUA, apontando para características das instituições do mercado de trabalho e custos de turnover elevados. Provavelmente não era nada disto que estava na cabeça de Serge Gainsbourg quando compôs Qui est in, qui est out. Mas é o que vem à cabeça deste que vos fala sempre que a ouve. A pergunta é relevante: quem são os outsiders do sistema de emprego em Portugal? Qui est out?

Para além do vínculo contratual, uma outra questão laboral da maior importância é o horário de trabalho. E se para Dolly Parton este horário é 9 to 5, a banda portuguesa Quarteto 1111 alude a uma criatura que foi trabalhar na fundição “das oito às seis/de acordo com as leis”.

A redução do horário de trabalho foi uma das maiores conquistas do movimento sindical. Em Which Side Are You On? é abordada a questão do sindicalismo e da organização e camaradagem entre trabalhadores. Segundo o Grupo de Ação Cultural (GAC), são estes que “constroem as casas, as cidades e as pontes”.

Matt Elliott, em Broken Bones, reserva um tratamento nada favorável a quem distribua injustamente a riqueza gerada (“Though they’ll break our backs, won’t share the spoils/Time to put some backs against the wall”). Em seu lugar, Alto Cutelo, d’Os Tubarões, fala-nos de imigrantes que encontravam trabalho em Lisboa como mão de obra barata e sem condições de vida digna (“Na CUF, na Lisnave e na J. Pimenta/Explorado/Mão de obra barato pá mâs qui trabadja/Mão de obra barato, barraca sem luz”).

Depois de um curto pregão – cantar entoado por vendedores um pouco por todo o país –, a lista termina com O milho da nossa terra, interpretado pelo Orfeão Universitário do Porto. Tal como aqui rezam as vozes, tratemos o milho – o seu estudo, condições e instituições – com carinho. Perdão, o trabalho. Queria dizer o trabalho.


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